Shane (Vincent Gallo) e June (Tricia Vessey) casaram-se recentemente e estão em plena lua-de-mel em Paris. Shane é um homem atormentado por ter um grande apetite sexual e, por causa disto, decide procurar seu velho conhecido Léo Semeneau (Alex Descas), um médico com quem trabalhou em experiências sobre a libido humana. O Dr. Semeneau está atualmente à procura de Coré (Béatrice Dalle), sua esposa, que era mantida presa no quarto mas fugiu recentemete. Shane decide ajudá-lo e acaba encontrando-a, agachada sobre um rapaz ensanguentado e cheio de mordidas.

Apesar de se confundir com alguns congêneres por causa do tabu de sua temática, Desejo e Obsessão é quase o oposto dos frutos de Larry Clark e Catherine Breillat. Estes últimos fazem filmes meramente pra chocar, e colocam o sexo como um fim em si mesmo. Nesse outro filme os meandros são mais dúbios e as motivações dos protagonistas muito mais dialéticas e perturbadas. Pela própria construção da narrativa o entendimento fica mais tortuoso, descartando possibilidades simplórias de análise que os anteriores em comparação permitem.
A complexidade de Desejo e Obsessão já começa por sua linguagem cinematográfica. Uma cena não prepara o espectador nem dá indício algum da cena posterior, tampouco serve de resposta à cena anterior. O desencadeamento dos fatos é desconexo. Não se trata de construção em flashback; é ruptura da ruptura mesmo. O filme é todo fragmentado, inclusive na mescla de gêneros e estilos.


Desejo e Obsessão é, em princípio, um filme anatômico. Suas lentes não se furtam de observar as curvaturas dos corpos e suas reentrâncias. A vagarosidade da câmera, ritmo inversamente oposto ao frenesi psicológico dos personagens, causa ao espectador uma sensação miscigenada de sadismo e conivência. O percurso epidérmico serve de metáfora para um questionamento maior em torno das angústias dos protagonistas.
De desejo há muito pouco. O filme é todo calcado na consciência da culpa. É como se Eros e Thanatos estivessem um de frente pro outro, colocando na tela o conflito dilemático entre a libido e a tortura. Embora se mantenha num ritmo pouco espetaculoso, o filme não deixa de exibir em tom alegórico esse prazer lúgubre. Aqui, o público tem uma noção bastante concreta das acepções e conotações que o verbo "comer" pode acarretar.
É no ato sexual que aparece a vontade antropofágica dos personagens. É como se a câmera estivesse preparando a carne dos corpos, mas quem se sente seduzido não é o público. É o próprio filme o protagonista do momento de abate. Se Denis não fez o filme apenas para agredir os olhos, por outro lado seu fetichismo auto-destrutivo surge como um novo elemento de visão de mundo irônica e pessimista.
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